Grandes Centros de P&D: o Bioquímico no Inst. Ludwig e Hosp. Sírio-Libanês
- Bioquímica Brasil
- 22 de jul. de 2015
- 8 min de leitura
Edição: Marcelo Depólo Polêto

A Paola Carpinetti-Oliveira, é bioquímica pela UFV (2006-2010), doutora em Bioquímica pela USP e trabalhou como assistente de laboratório no Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, em São Paulo.
- (Bioquímica Brasil) Paola, pode nos contar um pouco de sua trajetória acadêmica e profissional?
(Paola) Ingressei no bacharelado em Bioquímica na turma de 2006. Minha escolha não foi baseada na minha carreira profissional, pois naquela época não sabia ao certo qual era o campo de atuação do bioquímico e nem mesmo se existia mercado para absorver esses profissionais no Brasil, simplesmente escolhi um curso que teria prazer de frequentar. O que mais me atraiu foi a grade curricular, que diferia bastante dos demais cursos na área de biológicas e encaixava melhor nos meus interesses pessoais.
Durante a graduação, me interessei especialmente pela Biologia Molecular e por isso estagiei no Laboratório de Biologia Molecular de Plantas, sob orientação da professora Elizabeth Fontes, onde fui bolsista CNPq por dois anos. Conclui o curso em julho de 2010 e nesse mesmo período fui aprovada pelo Programa de Pós-graduação em Bioquímica do Instituto de Química da USP (IQ-USP) e iniciei meu doutorado direto.
Dentre os grupos de pesquisa do programa de pós-graduação, tive especial atração pelo Laboratório de Biologia Molecular e Genômica, liderado pela Dr.ª Anamaria A. Camargo, integrante do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer. Escolhi esse laboratório para desenvolver minha tese de doutorado devido a sua excelente estrutura e principalmente pela possibilidade de desenvolver uma pesquisa translacional, na qual teria a oportunidade de aplicar os conhecimentos obtidos nos laboratórios de ciência básica, na prática clínica.
Na minha tese, trabalhei como uma proposta de medicina personalizada, na qual identifiquei biomarcadores moleculares personalizados para monitoramento de pacientes com câncer de reto localmente avançado. Essa pesquisa foi baseada no sequenciamento completo do genoma tumoral de cada paciente, para a identificação de alterações genéticas específicas do tumor que pudessem servir como biomarcadores. O DNA circulante (Cell-free DNA – cfDNA) desses pacientes, obtidos através de amostras de sangue, foi utilizado para a detecção indireta de células tumorais e consequente monitoramento da doença. Toda essa metodologia foi planejada para ser compatível com o tempo de tratamento do paciente e facilitar sua aplicação na prática clínica.
No final do meu doutorado fui contratada pelo Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, como assistente de laboratório, onde permaneci até fevereiro de 2015.
- Você trabalhou no Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, em regime CLT. Como você aplica a bioquímica aprendida na graduação no seu trabalho? No que difere o cargo de assistente de laboratório no Ludwig de um bolsista em termos de responsabilidades, atribuições, direitos e deveres?
Como eu trabalhei em um laboratório de Biologia Molecular, grande parte dos conhecimentos obtidos na graduação e também na iniciação científica apliquei durante minha rotina diária. Seja na prática, com o domínio das técnicas, até mesmo os conhecimentos teóricos, que facilitaram meu entendimento de novas tecnologias, a resolução de problemas e adaptações de metodologias.
As principais diferenças que vejo são que, normalmente os alunos são responsáveis pelas atividades mais diretamente envolvidas com seus projetos, enquanto que, o assistente de laboratório, tem que estar atento à rotina do laboratório como um todo, além do que suas tarefas impactam diretamente no trabalho de muitas outras pessoas.
Os direitos dos celetistas são muito mais vantajosos que o dos alunos, primeiramente porque existem leis claras que regem essa relação e garantem direitos básicos, como jornada de trabalho fixa, férias, décimo terceiro salário, vale-transporte, e na maioria das vezes incluem também auxílio alimentação e plano de saúde. Pesa também o fato das atividades dos funcionários serem vistas como um trabalho, o que resulta em maior respeito, reconhecimento e preocupação com o crescimento desses profissionais. Por outro lado, os alunos têm sua remuneração garantida por um período de tempo fixo e pré-determinado.
Quanto aos deveres, os alunos têm uma certa vantagem, porque algumas vezes tem maior flexibilidade de horário, geralmente não se envolvem em questões mais burocráticas e são avaliados em períodos específicos. Enquanto que os funcionários são frequentemente avaliados e espera-se deles um constante crescimento dentro da instituição.
- No que o trabalho em instituições privadas de pesquisa como um todo diferem do ambiente de uma universidade pública, quanto aos objetivos e ambiente de trabalho?
Acredito que os objetivos em ambas sejam parecidos, embora vejo que as instituições privadas optem mais por pesquisa aplicada, translacional e que tenha uma certa notoriedade. No entanto, quanto ao ambiente de trabalho eu percebo uma clara diferença. Na universidade, como existem poucos cargos e a grande maioria que compõem o grupo de pesquisa é estudante, o ambiente acaba sendo mais colaborativo, informal e descontraído. Já nas instituições privadas, mesmo os estudantes seguem uma postura mais profissional, desde as vestimentas até quanto ao comportamento.
Para mim, o ambiente na universidade facilita a troca de informações, colaborações em projetos e o crescimento coletivo. Enquanto que o ambiente profissional aprimora o foco na pesquisa, senso de responsabilidade e crescimento individual. Ambas apresentam prós e contras, por isso acredito que a opção por uma ou outra, depende muito dos objetivos e perfil do profissional.
- O que é o Centro de Oncologia Molecular do Sírio Libanês? Quais são as oportunidades para o bioquímico se inserir nas instituições privadas, além da pesquisa acadêmica e da aplicada?
O Centro de Oncologia Molecular – (MOC), foi criado em dezembro de 2011 como resultado da parceria entre o Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer e o Hospital Sírio-Libanês. Tem sede no Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês (IEP-HSL) e conta com uma excelente estrutura e modernos laboratórios. Atualmente no MOC existem três grupos principais: Biologia Molecular e Genômica, Biologia Celular e Bioinformática, todos inseridos dentro da Oncologia. No entanto, dentro do IEP-HSL existem outros grupos que desenvolvem pesquisas em outras áreas que não o câncer, além de grupos de pesquisa clínica.
Dentro do IEP, os cargos são bem divididos e cada um requer um grau de experiência, habilidades específicas, bem como diferentes níveis de comprometimento e responsabilidade. As carreiras mais técnicas são: assistente de laboratório, técnico de laboratório e analista de laboratório. Esses cargos são encontrados em outros setores além da pesquisa, como diagnóstico, banco de tecidos e cordão umbilical. Existe ainda as carreiras de chefia, como diretoria, coordenação e superintendência. Na pesquisa, os cargos de pesquisadores geralmente são divididos em três níveis: júnior, pleno e sênior.
- Quais as vantagens da formação em Bioquímica que você percebe como determinantes para a área de Oncologia Molecular, tanto em P e D quanto no diagnóstico molecular?
Sem dúvida, se compararmos um recém graduado em Bioquímica com o de outros cursos da área de biológicas, vejo grande vantagem do bioquímico. Baseio minha opinião na profunda base de biomoléculas, metabolismo e biologia molecular que são oferecidas na graduação em Bioquímica, pois essas habilidades são de extrema importância dentro da Oncologia Molecular e facilitam a aquisição de conhecimento. Contudo, o bacharelado, pelo menos na UFV, não oferece nenhuma disciplina que aborde o tema de Oncologia, como biologia de tumores, princípios da tumorigênese ou outras relacionadas, como mecanismos de reparo de DNA, instabilidade genética entre outras. Adicionalmente, considero que as vantagens decresçam significativamente dentro da pós-graduação, onde as pessoas desenvolvem conhecimentos mais específicos e a possibilidade de busca de informação seja mais facilitada, principalmente dentro dos grandes centros acadêmicos.
- Como você vê o mercado de bioquímica clínica e diagnóstico molecular para o bioquímico, hoje? E o de medicina personalizada?
O mercado de diagnóstico molecular e medicina personalizada no Brasil tem crescido e se fortalecido nos últimos dois anos. Hoje já encontramos, nos grandes centros, um número razoável de empresas especializadas trabalhando e investindo nesses setores. Vejo nesse mercado uma grande oportunidade para os bioquímicos, uma vez que está em plena expansão e necessitando urgentemente de mão de obra especializada. No entanto, nesse quesito, o curso de bioquímica ainda está um pouco atrasado e não fornece vantagens competitivas, pois como esses setores utilizam recursos específicos e de alta tecnologia, na maioria das vezes, o bioquímico precisa de uma especialização ou pós-graduação para se destacar, que o iguala aos demais profissionais. A bioquímica clínica é um bom exemplo de mercado que já possui profissionais estabelecidos para trabalhar nesse setor, como farmacêuticos e biomédicos, e o bioquímico claramente tem desvantagens para se inserir nesse mercado.
- O que seria então diagnóstico molecular e medicina personalizada? Você acha que seja necessária alguma alteração ou acréscimo na grade de disciplinas para atuar bem nesta área?
O Diagnóstico Molecular utiliza as tecnologias mais recentes de Biologia Molecular, como PCR, qPCR, sequenciamento capilar e em larga escala, tanto de DNA como cDNA. Essa modalidade está mais diretamente relacionada à Medicina Personalizada, que utiliza informações genéticas do paciente e as associa com o conhecimento dos mecanismos moleculares das doenças para auxiliar em medidas preventivas, escolha do tratamento, e seguimento dos pacientes. Dentro do Diagnóstico Molecular, também incluo os testes genéticos dentro da área forense, como identificação humana e teste de paternidade. Faltam profissionais capacitados e a base de biomol dos bioquímicos é melhor, o que transforma este mercado em grande oportunidade.
Nota do editor: Saiba mais em Receitas genéticas contra o câncer
Já a Bioquímica Clínica é a bioquímica clássica dentro das análises clínicas, que já é tradicional nos cursos de farmácia. Para mim, a desvantagem do bioquímico na Bioquímica Clínica vai desde a tradição de atuação de outros profissionais e também porque as carreiras que trabalham nesse setor, direcionam um conjunto de disciplinas (módulo), para a área de análises clínicas, enquanto que na UFV, essa base se restringe a uma disciplina.
Quanto a estrutura curricular, acredito que uma das grandes vantagens do bacharelado em Bioquímica é justamente a base bem consolidada, uma vez que o campo de atuação é muito diverso. Entretanto, a disponibilidade de disciplinas optativas mais voltadas para a área da Saúde, seria bem-vinda e auxiliaria aqueles que pretendem seguir nessa área, principalmente nos segmentos que não possuem uma classe de profissionais especializados, com as competências necessárias, como é o caso do diagnóstico molecular. Embora sejam relacionadas, bioquímica clínica e diagnóstico molecular são bem diferentes. As competências que eu acredito serem necessárias, dentro de uma suposta disciplina de Diagnóstico Molecular, são desde um aprofundado conhecimento das novas tecnologias de Biologia Molecular com foco na aplicação na clínica, quanto sólidos fundamentos de Genômica, Transcriptômica e Epigenética (metilação e microRNA).
- O que representou para a sua carreira participar da Tecnomol (empresa júnior), como diretora de marketing?
Quando participei da Tecnomol ela ainda não era o sucesso de agora, estava desestruturada e até abandonada. Juntamente com outros muitos colegas, decidimos investir nosso tempo e dedicação para retomar a empresa júnior, justamente por a considerarmos de grande importância para a formação dos futuros alunos. Considero a Tecnomol uma das poucas maneiras de despertar o caráter empreendedor nos alunos, além de informar e capacitar os alunos nas mais diversas áreas. Na minha carreira, a Tecnomol representou um importante contato com os bastidores de uma empresa, no qual tive que resolver questões burocráticas, aprendi sobre a importância do planejamento e como trabalhar em equipe.
- Que conselhos daria aos bioquímicos que estão começando agora?
Primeiramente, que procurem se informar sobre os campos de atuação do bioquímico e se for possível identificar uma área de interesse, direcione suas atividades acadêmicas nesse sentido, desde o início da graduação. Segundo, não sigam os passos de outras pessoas por inércia, pois o mercado é muito amplo e o caminho que uma pessoa seguiu e teve sucesso, não necessariamente será bom para vocês. Por último, tenham coragem e persistência, seja para mudar de direção quando não se sintam mais motivados ou para abrir novos caminhos. Nesse canal têm sido apresentados inúmeros exemplos de pessoas que abriram caminhos nas mais diversas áreas. A formação que o curso nos dá é de excelente qualidade e com um enorme leque de possibilidades, é só acreditar e se dedicar que o sucesso chega.
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