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O Bioquímico na Pesquisa científica: Prêmio Loreal Mulheres na Ciência

  • Fernanda Tonelli
  • 1 de out. de 2017
  • 8 min de leitura

Fernanda Tonelli, Bioquímica formada pela UFSJ (2008 - 2011), mestra em Bioquímica e Imunologia (área de concentração Bioquímica) pela UFMG e doutora em Bioquímica e Imunologia (área de concentração Biologia Molecular) pela UFMG. Atualmente é pesquisadora do Instituto Nanocell.


1. Como foi sua escolha do curso? Quando você entrou você já tinha noção que era diferente de farmácia e de biotecnologia?


Sim, sabia. Durante o ensino médio meu interesse pelo trabalho em laboratório se despertou com as aulas práticas. Ao final do terceiro ano, fiquei indecisa sobre a escolha da graduação, pois gostava muito de química, física, matemática e biologia (em especial os assuntos relacionados ao DNA). Dentre estes bacharelados, optei por Química, pois imaginei que poderia ser ofertada mais ampla gama de atuações profissionais no futuro. Ingressei no curso da UFMG no início de 2007. No entanto, após cursar o primeiro período e ser apresentada à grade da graduação, percebi que a carga biológica do curso estava restrita praticamente a uma disciplina de bioquímica. Comecei a pesquisar na internet por um curso que tivesse carga horária mista e equilibrada entre exatas e biológicas. Encontrei a Bioquímica, que já existia na UFV, e me interessei pela proposta do curso. Na sequência começaram a anunciar que o campus UFSJ em Divinópolis ofertaria esta graduação. Fiz vestibular novamente, especificamente para o bacharelado em Bioquímica nos moldes da UFV, e ingressei na primeira turma em Divinópolis.


2) Nos conte como foi sua trajetória acadêmica até aqui?

Durante o primeiro ano de graduação já me dediquei à iniciação científica, que ia ao encontro ao meu desejo de me aproximar da pesquisa e da rotina de trabalho em laboratório. Só existiam dois projetos disponíveis no campus naquela época: levantamento de utilização de plantas medicinais pela população da cidade e busca por protótipo de herbicida natural em extratos vegetais de espécies do cerrado brasileiro.Me dediquei a esta última proposta e trabalhei durante 3 anos sob orientação do professor João Máximo na área de alelopatia (confira texto sobre a área publicado neste site). Ao final deste prazo pude publicar o meu primeiro artigo científico referente a esta pesquisa que foi meu trabalho de conclusão de curso (TCC). Na sequência, no meu quarto e último ano de graduação, decidi me aproximar da biologia molecular, que sempre havia chamado minha atenção na área biológica. Os professores que trabalhavam nesta área haviam chegado ao campus e implantado suas linhas de pesquisa. Meu trabalho já constituía parte de um grande projeto de geração eficiente de tilápias do Nilo transgênicas. A primeira etapa desse projeto seria verificar se a espermatogônia tronco de tilápia aceitava com facilidade ou não DNA exógeno visando expressão de proteína de interesse – etapa a qual me dediquei durante o fim da graduação e mestrado, sob orientação do Prof. Rodrigo Resende. Durante o doutorado continuei a pesquisar e desenvolvi maneiras de se obter o animal transgênico de forma eficiente e eficaz. Atualmente desejo obter sucesso na modificação sítio dirigida no genoma do peixe, para geração de animal biorreator. Além dos experimentos, tive a oportunidade de participar de projeto de extensão na área de divulgação científica. No ano de 2013 foi fundado o Instituto Nanocell (www.institutonanocell.org.br), do qual sou membro da primeira diretoria.


3. Como você aplica os conhecimentos adquiridos no curso no seu dia a dia de trabalho?

Ainda trabalho bastante com pesquisa e experimentos em bancada. Assim sendo, realizo a aplicação de ampla gama de conhecimentos adquiridos durante a graduação em Bioquímicacomo rotina.Necessito de aplicar técnicas bioquímicas de análise, procedimentos relacionados à biologia molecular, tenho sempre em mente estrutura e função de macromoléculas, principalmente do DNA; os conhecimentos de biologia celular e cultura de células também são de ampla importância na minha área de atuação. Como tive a oportunidade de trabalhar com nanomateriais no mestrado e doutorado, o conhecimento sobre a estrutura destes materiais e sobre biotecnologia também são diretamente aplicáveis. No que diz respeito ao Instituto Nanocell, os conhecimentos adquiridos na graduação são bastante úteis, visto que me permitem escrever textos sobre diferentes temas relacionados à bioquímica e ciência em geral, visando facilitar o acesso da população como um todo ao conhecimento científico. Mais recentemente tenho ainda vivenciado uma etapa de muito aprendizado com a criação da startup Nanocell, aplicando e aprofundando conhecimentos de administração e empreendedorismo, voltando os olhos para a interação entre pesquisador e iniciativa privada.


4. Que características técnicas (disciplinas) e humanísticas você acha que o bioquímico deve desenvolver para ser um bom pesquisador científico?

Penso que a importância das disciplinas depende da área em que o bioquímico tem interesse em atuar. As disciplinas essenciais são aquelas que vierem a fornecer base teórica ao bioquímico para que possa aprofundar seus estudos no campo de seu interesse. No meu caso, tendo em vista a grade da Bioquímica UFSJ de quando me graduei, seriam: biologia celular, biologia molecular, práticas em biologia molecular, práticas em bioquímica I e II, cultura de células e tecidos, biotecnologia aplicada à saúde, biotecnologia de microrganismos.

Com relação às características humanísticas, o bioquímico deve ser questionador, não ter medo de errar, estar disposto a aprender com erro, buscar sempre inovação e melhoria de processos e produtos com os quais lida, ter conhecimento teórico da área a que se dedica pesquisar, estar sempre antenado para novidades no seu campo de trabalho, ser capaz de trabalhar em equipe e principalmente em equipes multidisciplinares, estar sempre disposto a aprender mais, estar atento aos problemas que as indústrias e a sociedade enfrentam na atualidade com relação ao seu campo de atuação, ser proativo.


5. Você recentemente ganhou o prêmio L’Oréal Mulheres na Ciência por seu trabalho inovador. Como você vê a questão de gênero na pesquisa científica como um todo e em particular na profissão de bioquímico?

Com relação à pesquisa científica, segundo a Elsevier, mulheres já produzem no Brasil aproximadamente 50% dos artigos científicos que são publicados. Isso, por si, já reflete a ascensão das mulheres na carreira científica. No entanto, um prêmio como esse da L’Oréal, UNESCO e Academia Brasileira de Ciência, que se dedica exclusivamente a mulheres, tem uma importância muito grande por valorizar e destacar essa participação feminina na ciência. Além de cumprir esta função no meio científico, como resultado da ampla divulgação, acaba por contribuir também para a valorização da mulher na sociedade em geral. É uma forma de realçar a capacidade intelectual feminina, especialmente na ciência. Soma-se a isso o fato de esta ação ter ainda o potencial de incentivar mais mulheres a se dedicarem à carreira científica.

No que diz respeito à profissão de bioquímico, nas situações que tenho conhecimento a respeito, as mulheres já chegam a ser maioria. Na minha turma de graduação, nós éramos a maioria da classe e quando eu tiver oportunidade de ministrar aulas como substituta na UFSJ, me deparei com o mesmo cenário: maioria da classe constituída por mulheres.


6. Você escolheu ser pesquisadora científica, mas você acha que o bioquímico deve se voltar apenas à pesquisa científica ou ter outras perspectivas profissionais?

De maneira nenhuma o profissional bioquímico deve se limitar à pesquisa científica, principalmente em época como esta que vivenciamos já há alguns anos no Brasil. Com o declínio de investimentos em pesquisa e em educação como um todo, penso que o bioquímico deve manter-se aberto às oportunidades de atuação não só no meio acadêmico. Deve considerar também a possibilidade de atuação em instituições como empresas privadas e ambientes industriais, por exemplo. Ele pode exercer papéis como bioquímico industrial, clínico, gestor, empreendedor, dentre outros, e até mesmo inovar a ponto de criar seu próprio mercado de trabalho. É recomendável que o bioquímico explore as atuações a ele resguardadas por lei, e que vierem a ser do interesse individual de cada bacharel. Ele deve considerar que pode possuir habilidades que lhe permita se adequar não apenas a um destes perfis e,caso não possua as habilidades necessárias, considerar que pode vir a desenvolver estas habilidades, se assim desejar. No meu caso, por exemplo, trabalho no momento como pesquisadora, mas juntamente com um grupo de amigos empreendemos e criamos o Instituto Nanocell, e estamos criando a startup Nanocell. Seguimos aprendendo a empreender e considero ser um aprendizado muito interessante ao bioquímico.


7. Como toda a crise de financiamento da ciência básica no Brasil, você acha que os pesquisadores devem se relacionar mais com empresas e indústrias diretamente ou indiretamente via Finep ou financiadores particulares como Serrapilheira?

Atualmente o pesquisador que depende exclusivamente de agências de fomento públicas estaduais ou federal, está em maus lençóis. O projeto contemplado pelo prêmio da L’Oréal, por exemplo, não é nesta fase financiado por nenhuma agência de fomento brasileira. Ele foi financiado pelo CNPq nas suas fases iniciais, quando o estudo ainda estava limitado a células em cultura, e atualmente é completamente mantido por verbas de doações captadas pelo Instituto Nanocell e revertidas para a manutenção do Laboratório de Nanobiotecnologia e Sinalização Celular, na UFMG. Na verdade, é extremamente necessário que os pesquisadores enxerguem oportunidades de interação com empresas e institutos privados de financiamento e também que se preocupem em tirar do papel seus pedidos de patente e conferir a eles aplicação real, empreendendo e gerando produtos ou prestando serviços. Dessa maneira acredito que até a visão do pesquisador pela sociedade possa ser melhorada, visto que o que se produz em laboratório, uma vez estando alinhado com necessidades reais, possa refletir de fato em alguma melhoria para a população. Reclama-se muito que a sociedade não valoriza o pesquisador e a pesquisa no país, mas é compreensível, pois fica difícil valorizar aquilo que não compreendemos e que parece estar tão distante.


8. Qual tem sido o papel do Instituto Nanocell na sua formação e na ciência em especial?

O Instituto tem sido o financiador dos meus projetos (de doutorado e o do peixe GH). Mas mais do que isto, é a possibilidade diária de aprendizado sobre gestão e de como falar em linguagem que possibilite à população entender sobre o que está sendo produzido de inovação em ciência no mundo. É uma oportunidade de aproximação da realidade de ensino brasileiro nos ensinos fundamental e médio e através da plataforma “Alô, escolas!” (http://www.nanocell.org.br/alo-escolas/) tentar contribuir para que experimentos de baixo custo possam ser realizados em sala de aula para ilustrar conceitos importantes e, quem sabe, atrair assim a atenção dos alunos para a ciência. O Nanocell é ainda um viabilizador de contato com grandes nomes da pesquisa brasileira e empresas nacionais de biotecnologia por meio do Congresso anual que organizamos, no qual são entregues os prêmios de empreendedor e de cientista do ano em diferentes categorias do “Prêmio Cientistas e Empreendedor do Ano Instituto Nanocell”.


9. Com base na sua experiência, que conselhos você daria ao atual aluno de bioquímica?

O conselho que eu daria para o aluno de bioquímica é adotar uma postura proativa no processo de aprendizagem: independentemente do professor, ele deve visar descobrir a sua própria maneira de aprender e sempre buscar o conhecimento que for do seu interesse. Atualmente é possível se ter além dos livros a internet como grande aliada no processo de aprendizagem. O professor pode auxiliá-lo neste processo, mas o fator determinante de seu sucesso é o seu próprio esforço enquanto estudante. Recomendaria ainda que os futuros bacharéis em bioquímica não se mantenham fechados para outras oportunidades para além da carreira acadêmica, que desenvolvam habilidades que estejam alinhadas com o que as empresas procuram. O Brasil já não é mais capaz de absorver a todos como pesquisadores e/ou professores em instituições públicas e, mesmo que o fosse, isto não seria saudável para reconhecimento de nossa profissão. Caso não queira trabalhar em empresa, estas habilidades também serão muito úteis na carreira científica, diferenciando o bioquímico de seus pares.

 

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